quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

A primeira vez que ouvi falar de Bartolomeu Campos de Queirós


Na verdade, não me lembro a primeira vez em que ouvi falar de Bartolomeu Campos de Queirós. Até lembro, mas não de forma clara. O que talvez seja uma forma bem interessante de reminiscência. Nada de precisão histórica.

Na universidade, ainda como ouvinte, eu, um estranho no ninho das letras, lembro de uma professora amiga, falando de uma tal Correspondência, que depois (empatado com Flora) se tornou o meu predileto. Talvez por trazer as impactantes ilustrações de Angela Lago.

Depois, no curso de Especialização de Literatura Infantil e Juvenil da UFRJ, lembro de ler Onde tem bruxa, tem fada, na primeiríssima versão, com ilustrações em vinho, ou era grená? Nada como rimar mnemônica com daltônica… O impacto e a certeza que a literatura infantil passaria a ser minha vida.

E, meio enevoadamente, outra recordação, na conversa macia de uma amiga bibliotecária, falando com tal propriedade da obra (a paixão dela era Indez. Ou será que era Por parte de pai? Hum, minha memória fugidia resmunga que foi a época que Ler, escrever e fazer conta de cabeça era nova fornada… ai, não sei) e tal intimidade estabelecida com a vida do Bartô. Era Bartô. E aí, eu quis logo entrar para o clube dos que conheciam os livros daquele autor. E quis também conhecer o autor. E, principalmente, quis parecer íntimo, me enturmar, não estar simplesmente entre os que diziam Bartolomeu Campos de Queirós, mas sim os que, como que estando de pés descalços na areia, podiam dizer Bartô. Sim, porque Bartô era uma pessoa que te deixava no mesmo estado que você experimenta quando chega em casa: sensação de tranquilidade, de paz e conforto, de segurança. Para mim, estar com Bartô, seja em contato pessoal, seja imerso em sua poesia, era como estar em casa. Relembro um café da manhã com ele, num hotel, por ocasião de um congresso de leitura, primeira vez que fiquei mais íntimo. Comer, comungar, compartilhar de um pão de voz com autor admirado? Como fiquei impressionado pelo fato de, pela manhã, ele ser rigorosamente o mesmo que à tarde falava para um auditório lotado. 

Engraçado que acho que Correspondência não é um livro que é muito mencionado no rol das predileções da obra do Bartolomeu. Tantos outros são mais frequentemente citados, como Pedro, O peixe e o pássaro, De não em não, Mário, Até passarinho passa, Ciganos, O livro de Ana… Talvez pela ocasião em que foi lançado, o momento da Assembleia Constituinte, muitos possam fazer uma leitura ligeira e tacharem como datado. Não tiveram a felicidade de ver Bartô em sua delicada pujança, pleno em seu ofício de acordar certas palavras e colocar outras, “erradas”, para adormecer. Eu fui agraciado com a chance de estabelecer uma inesquecível correspondência.   

Para quem ainda não conhece sua obra, a verdade é que nada do que eu falar ou escrever dará conta da força, do impacto, da sutileza do estilo de Bartolomeu Campos de Queirós. Sua prosa poética (expressão repetida como mantra por nós, críticos-fãs) é uma mirada filosófica amalgamada em líricas e delicadas narrativas. Caso eu respeitasse mais as palavras, eu evitaria usar os termos nostálgico e sentimental, pois as pobres palavras têm sofrido de perseguição aguerrida. Mas não me esquivo de parecer fora de moda. Existem questões e valores que estão para além dos modismos.

Transbordando de afetos, recheada de memórias, plena de significados e, principalmente, muito segura e orgulhosa da epifania de que nosso lugar no mundo há de ser conquistado, à custa de uma guerreira sensibilidade, a vida-obra de Bartô foi toda como ele: íntegra e inteira. 

É isso, Menino inteiro, boas leituras por aí, bem sentadinho no ombro esquerdo do Grande Escritor.

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